está a ler...
Justiça

Atropelamento intencional

O atropelamento está associado tradicionalmente a acidentes de trânsito, mas também pode ter outros contornos, ou seja, ser utilizado deliberadamente em contextos de conflito, crime ou fuga.

Têm sido relatados diversos casos na imprensa:

A este propósito, num Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, 11/03/2025 decidiu-se o seguinte:

  1. O arguido que, de forma voluntária e consciente, dirige um veículo automóvel (carrinha) contra pessoas que se encontravam num passeio destinado à circulação de peões, desprevenidas, conhecedor das dimensões, potência e capacidade de impacto daquele, não poderia deixar de saber, como qualquer pessoa comum sabe, que esse veículo, nessas circunstâncias, utilizado como instrumento de agressão, é dotado de uma grande capacidade de impacto e letalidade.
  2. Ao assim proceder, propositadamente e sem diminuir a marcha desse veículo, numa atitude revanchista relativamente a uma altercação ocorrida anteriormente, e indiferente ao resultado da sua conduta, com que se conformou, incorre na prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, com dolo eventual, previsto e punível pelos artigos 131º, 132º, nºs 1 e 2 h), 14º, nº 3, 22º, 23º e 73º, nº 1, als. a) e b) do CP).
  3. Os factos alcançados por prova direta, impõem a presunção sobre os demais constantes da acusação, concretamente os relativos à componente subjetiva que presidiu à sua atuação.

Os casos recentemente divulgados na imprensa e o entendimento firmado pelo Tribunal da Relação de Guimarães convergem numa mesma ideia central: o atropelamento, embora tradicionalmente associado a acidentes de trânsito, pode assumir um carácter nitidamente criminoso quando o veículo é utilizado como instrumento de agressão. A jurisprudência reforça que, quando o condutor atua de forma consciente, voluntária e indiferente ao resultado, assumindo o risco de provocar a morte, a responsabilidade penal não pode ser desvalorizada como mera imprudência rodoviária. 

Assim, ganha relevo a necessidade de reconhecer estes comportamentos como formas graves de violência, exigir respostas firmes e continuar a reforçar a perceção social de que o automóvel, quando usado deliberadamente, pode ser tão letal como qualquer outra arma.

Pedro Murta Castro

Discussão

Ainda sem comentários.

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

WOOK