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Catástrofes

Na eventualidade de um sismo

1.De acordo com o ordenamento jurídico português, entende-se por catástrofe “o acidente grave ou a série de acidentes graves susceptíveis de provocarem elevados prejuízos materiais e, eventualmente, vítimas, afetando intensamente as condições de vida e o tecido socioeconómico em áreas ou na totalidade do território nacional” [1]. Este tipo de evento tem como elementos caracterizadores a possibilidade de existirem vítimas, a destruição, a sua amplitude territorial, e acima de tudo, uma desproporcionalidade acentuada entre os meios humanos e materiais de socorro e as vítimas a socorrer.PNEPC

2.Os sismos fazem parte do leque de catástrofes. São fenómenos naturais, originados por uma ruptura da parte interior da crosta terrestre, ligados à libertação de uma grande quantidade de energia, de onde resultam vibrações que atingem uma vasta área circundante. Podem ser causados por movimentos ao longo de falhas geológicas existentes entre diferentes placas tectónicas (sismicidade interplaca); movimentos de falhas existentes no interior das placas tectónicas (sismicidade intraplaca); actividade vulcânica e movimentos de material fundido em profundidade; deslocações superficiais de terreno, tais como abatimentos e deslizamentos; actividade humana (sismicidade induzida): grandes massas de água em barragens, injeção ou extração de fluidos da crosta terrestre ou detonação de explosivos.

3.De acordo com a Sociedade Portuguesa de Engenharia Sísmica, devido à sua localização, junto à fronteira de placas Euroasiática e Africana (Núbia) designada por fratura Açores-Gibraltar, o território de Portugal Continental e Insular carateriza-se por ser uma zona de sismicidade assinalável. Diversos eventos ao longo dos tempos atestam esta caraterização, destacando-se o de 1755 em Lisboa

4.Temos seguido atentamente os comentários que têm sido efetuados relativamente à tragédia recentemente ocorrida na Síria e na Turquia, onde, neste momento, o número de vítimas mortais ascende a quase 10000. Uma fatia significativa dos especialistas tem vindo a afirmar que uma situação destas em Portugal, muito provavelmente, não teria consequências tão devastadoras. 

5.Neste domínio não poderemos deixar de levantar algumas questões. Em primeiro lugar, existem meios de socorro, mas estarão todos (sem exceção) aptos a intervir em catástrofes deste tipo?  É que todos deveriam ter esta capacidade, porque os que estão sediados nas zonas de maior risco poderão ficar inoperacionais na sequência do sismo e das suas réplicas. as primeiras horas de resposta são cruciais. Argumenta-se com a ajuda internacional, mas esta demora sempre a entrar em ação, sendo  preciso implementar medidas de coordenação, limitando-se, por isso, muitas vezes, a socorrer os feridos, a localizar e a identificar os mortos, dado que o número de sobreviventes nos escombros será, nesse momento, muito residual.

6.No caso concreto da área metropolitana de Lisboa, existe um Plano Especial de Emergência para o Risco Sísmico na Área Metropolitana de Lisboa e Concelhos Limítrofes (PEERS-AML-CL) e em 2013 foi aprovado um Plano Nacional de Emergência de Proteção Civil. Mas, têm havido exercícios que permitam aferir os níveis de coordenação e de cooperação entre os vários atores? Gostaríamos de relembrar que alguns deles atuam diariamente num ambiente de concorrência (havendo necessidade de criar mecanismos para sanar alguma crispação no seu relacionamento), o que a ser replicado para um cenário deste género ainda ampliaria mais os respetivos efeitos. Como se escreveu em tempos, “não se pode olvidar o fato de que a qualidade da resposta da proteção civil, num caso real, depende, sobretudo, do grau de preparação dos diferentes atores e da experiência obtida quer em simulações quer em situações reais, trabalhando sobre o lastro e dentro das baias estabelecidas num plano de emergência de proteção civil”.

7.Finalmente, temos assistido diariamente a imagens de prédios que colapsam como “castelos de cartas” na Síria e na Turquia, contribuindo para o aumento do número de vítimas,  atribuindo-se tal facto à inexistência ou à violação de regras legais, regulamentares ou técnicas que devem ser observadas nas várias fases da construção. E por cá, qual é o “estado da arte”? Relativamente a esta matéria, quatro pontos de uma notícia do Público são, no mínimo preocupantes[2]:

  • Quase 68% dos edifícios de Lisboa foram construídos antes da lei de proteção sísmica;
  • Até 1983 a proteção contra sismos era rudimentar;
  • Só a partir de 1990 é que a preocupação aumentou;
  • Lisboa é a segunda cidade com mais riscos sísmicos a seguir a Istambul. 

E quem nos garante que os edifícios construídos depois da entrada em vigor da nova legislação a cumprem?

Por tudo isto, permitam-me discordar de alguns especialistas, mas perante a ocorrência em território nacional de  um quadro sísmico análogo ao da Síria e da Turquia, os meus níveis de otimismo e de confiança são bastante menores.

Pedro Murta Castro

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[1] Artº 3º, nº 2, da Lei nº 27/2006, de 03/07/2006 (Lei de Bases da Proteção Civil – LBPC).

[2] Quase 68% dos edifícios de Lisboa foram construídos antes da lei de protecção sísmica. In Público

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