A este propósito, num Acórdão de 11/05/2023, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu o seguinte:
I – A Lei do Cibercrime é uma legislação especial que veio estabelecer disposições penais materiais e processuais relativas ao domínio do cibercrime e da recolha de prova em suporte electrónico (secundarizando o Código de Processo Penal) para fazer face a novas realidades e inerentes especificidades, tais como dos dados informáticos e do correio electrónico, justificando-se o sacrifício do interesse individual numa comunicação livre de interferências alheias, em prol do exercício do “ius puniendi” estadual.
II – Mas, a apreensão (mesmo gozando de legitimidade formal pela existência de prévia autorização ou ordem judicial de apreensão) não legitima, “per si”, a valoração dos elementos probatórios assim conseguidos.
Para o efeito, é ainda necessário que o Juiz seja a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo apreendido, conhecimento esse que não tem de ser obrigatoriamente completo/total.
Depois, os elementos apreendidos podem ser enviados pelo Juiz ao Ministério Público para que este emita proposta/parecer sobre a relevância, ou não, para a descoberta da verdade ou para a prova dos factos em investigação (pelo mesmo (Ministério Público face à estrutura acusatória de qualquer processo penal).
Então o Juiz estará em condições de melhor aferir qual o conteúdo relevante e ponderar da necessidade, ou não, da sua junção aos autos como meios de prova e, em caso afirmativo, com a inerente compressão de direitos constitucionais.
III – O Juiz de instrução é um garante dos direitos fundamentais dos diversos intervenientes no processo penal, porém não controla o exercício da ação penal.
A intervenção do Juiz de Instrução Criminal em sede de inquérito deve pautar-se por um princípio da intervenção enquanto Juiz das liberdades (e não como Juiz de investigação), respeitando o modelo constitucional de divisão de funções entre a magistratura judicial e a magistratura do Ministério Público.
Sousa dos Santos
Discussão
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