Os acidentes consubstanciam-se em acontecimentos não desejados ou não programados, repentinos, fortuitos, com efeitos indesejáveis e, por isso, suscetíveis de provocar danos de diversa ordem, podendo ocorrer num amplo espectro de atividades, designadamente nos transportes, na indústria e na área laboral.
Mercê da globalização, assiste-se a uma acentuada procura dos diferentes meios de transporte (aéreo, ferroviário, marítimo, terrestre), quer para a deslocação de pessoas, quer para a movimentação de mercadorias.
Neste contexto, a atividade industrial está intimamente ligada ao transporte de mercadorias perigosas, as quais constituem uma fatia significativa da totalidade das mercadorias transportadas (aproximadamente 10%). Dentro destas predominam os combustíveis líquidos e gasosos, onde se insere uma diversidade de matérias, objetos, soluções e misturas cujo transporte rodoviário está sujeito a condicionantes. Isto prende-se com a sua inflamabilidade, ecotoxicidade, corrosividade ou radioatividade, por meio de derrame, emissão, incêndio ou explosão que podem provocar consequências imprevisíveis.
O transporte de mercadorias perigosas por estrada ou caminho-de-ferro apresenta riscos de acidente consideráveis. Daí que a 22 de Abril de 2004, um comboio carregado de explosivos quando passava pela cidade de Ryongchon, na Coreia do Norte, explodiu, matando 161 pessoas. E, a 18 de Fevereiro de 2004, mais de 300 pessoas morreram quando uma composição ferroviária com 51 vagões cheios de petróleo, fertilizantes e enxofre descarrilou e explodiu, perto da cidade de Nishapur, no Irão.
A este propósito é de referir que em 2010, no território nacional, o tráfego ferroviário de mercadorias perigosas ascendeu a 1 492 milhões de toneladas, com destaque para as “matérias perigosas diversas (amianto, PCB’s[1] e aparelhos contendo PCB’s)” e ”matérias líquidas inflamáveis” de que foram transportadas 934 e 303 toneladas, respetivamente.
O transporte de mercadorias perigosas por via terrestre (rodoviária e ferroviária) é regulado em Portugal pelo Decreto-Lei n.º 41-A/2010, de 29 de Abril, o qual, nos termos da alínea f) n.º 8 do Art.º 13, determina que constitui obrigação do embalador, do carregador, do enchedor, do transportador ou do destinatário, consoante o caso, garantir a elaboração dos relatórios de acidente por parte do conselheiro de segurança nomeado, de acordo com os critérios e modelos definidos por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Proteção Civil, no prazo de 20 dias úteis a contar da data da ocorrência do acidente.
Por seu turno, o despacho n.º 12160/2012, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 180, de 17 de setembro de 2012, do presidente da Autoridade Nacional de Proteção Civil, define os modelos de relatórios de acidentes no transporte rodoviário e ferroviário de mercadorias perigosas. Os quais devem ser elaborados e alvo de posterior análise, nas seguintes situações:
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Explosão;
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Incêndio;
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Perda de contenção da mercadoria ou queda de parte ou da totalidade da carga durante o transporte;
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Necessidade de trasfega da mercadoria para outro reservatório, efetuada fora de um recinto apropriado;
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Morte ou lesões provocadas pela mercadoria perigosa;
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Intervenção no local de serviços de emergência públicos ou de elementos a cargo da empresa expedidora ou transportadora;
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Outros acontecimentos com características que, do ponto de vista do conselheiro de segurança, apresentem interessa técnico específico para a prevenção de acidentes ou para a limitação das respetivas consequências.
Através da publicação deste Despacho, ficou revogado o despacho n.º 2338/2001, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 29, de 3 de fevereiro de 2001 que aprovou o anterior modelo.
Deste relatório fazem parte os dados identificativos da empresa, os elementos relativos ao acidente (data/hora, local, mercadorias, vagões/veículo), as características do acidente (origem, intervenção das mercadorias, consequências), ao que se juntam as recomendações efetuadas pelo conselheiro de segurança na vertente técnica ou operacional (correções relacionadas com falhas humanas ou do equipamento), e na organização da segurança (v.g. formação, treino, procedimentos).
Portanto, um pouco à semelhança daquilo que acontece com a investigação dos acidentes de aeronaves, ou dos acidentes ferroviários, embora sem recurso a entidades independentes especializadas[2], trata-se, sobretudo, de um processo que visa a prevenção de ocorrências futuras, e que para o efeito envolve a recolha, análise de informações e a elaboração de conclusões.
Gomes Lopes
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