Os avanços da ciência, ocorridos nas últimas décadas, conseguiram trazer a transplantação de órgãos do campo do impossível para a realidade do nosso dia-a-dia, sendo uma atividade levada a cabo em serviços especializados hospitalares um pouco por todo o mundo.
A transplantação de órgãos é o tratamento com uma melhor relação custo-eficácia nos casos de insuficiência renal crónica terminal, sendo o único tratamento disponível nos casos de insuficiência terminal de órgãos como o fígado, os pulmões e o coração. Contudo, o acesso dos pacientes ao transplante de órgãos, varia de acordo com a rede hospitalar instalada, o custo dos cuidados de saúde, o nível de capacidade técnica e, mais importante, a disponibilidade de órgãos.
Devido aos riscos que comportam, a dádiva, a colheita, a caracterização, a análise, a preservação, o transporte e a transplantação de órgãos (v.g. rins, fígado, pulmões, coração) devem ser acompanhadas de um conjunto específico de medidas de segurança e de qualidade, de forma a evitar a possibilidade de transmissão de doenças.
Por outro lado e de molde a proteger tanto os dadores como os recetores e a acautelar uma eventual tendência para a “mercantilização” devem ser estabelecidos mecanismos legais assentes nos princípios da dignidade da pessoa humana, da proteção do dador e do recetor (v.g. vida, integridade física, saúde), e da dádiva voluntária e gratuita.
Nesta matéria, nunca se pode perder de vista a natural propensão que o crime organizado tem para intervir através do tráfico de órgãos, por vezes associado ao tráfico de seres humanos com o propósito da remoção de órgãos, com riscos acrescidos para o dador, cite-se a título de exemplo que a colheita de rins ou de partes do fígado provoca hemorragias que podem ser fatais, tal como a dos óvulos associada ao tratamento hormonal pode originar cancro e esterilidade. Mas o risco é também extensível ao recetor, pois um dador portador de um determinado quadro clínico a quem tenha sido colhido um órgão, sem o seu consentimento ou sob pressão financeira, pode não ter revelado o seu passado clínico, o que constitui um risco para primeiro.
É neste contexto que foi publicada a Lei n.º 36/2013, de 12 de junho, a qual estabelece as normas que visam garantir a qualidade e segurança dos órgãos de origem humana destinados a transplantação no corpo humano, de forma a assegurar um elevado nível de proteção da saúde humana, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2010/53/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de julho, tendo como âmbito de aplicação a dádiva, colheita, caracterização, análise, preservação, transporte e implantação de órgãos de origem humana destinados a transplantação no corpo humano. Este quadro legal não se aplica à utilização de órgãos para fins de investigação, exceto se os mesmos se destinarem à transplantação no corpo humano.
Nos termos desta lei, a dádiva de órgãos é voluntária e não remunerada, tendo os dadores vivos direito a receber uma compensação estritamente limitada a cobrir as despesas efetuadas e a perda de rendimentos relacionados com a dádiva, a qual não pode constituir um incentivo ou benefício financeiro para este fim. Por outro lado, o dador vivo tem sempre direito a ser indemnizado pelos danos decorrentes deste processo, independentemente de culpa.
Finalmente, a atividade desenvolvida pelas unidades de colheita não pode ter caráter lucrativo, sendo proibida a publicidade sobre a necessidade de órgãos ou sobre a sua disponibilidade, quando tenha por intuito oferecer ou procurar obter lucros financeiros ou vantagens equivalentes.
Gomes Lopes
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