Em 01/03/2012, uma militar da Guarda Nacional Republicana (GNR) participou numa manifestação, em Lisboa, promovida pela Associação dos Profissionais da Guarda (APG). Na sequência de factos ali ocorridos, foi determinada a instauração de procedimento disciplinar contra esse militar, dado que estaria na linha da frente da manifestação, entre manifestantes que gritavam palavras de ordem contra o Ministro da Administração Interna, que incluíam as expressões “Gatuno, Gatuno”, dos quais não se terá apartado.
Mercê da violação de vários dispositivos legais a que os militares da GNR estão subordinados, por despacho da Ministra da Administração Interna de 31/12/2014, foi aplicada ao militar em apreço a pena de suspensão pelo período de 60 dias, com a execução suspensa pelo período de um ano.
Inconformado com esta decisão, o militar interpôs uma ação administrativa contra o Ministério da Administração Interna no Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela a pedir a anulação do ato, recorrendo posteriormente para o Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN) que indeferiu o recurso, porque:
1– A decisão disciplinar constitui o culminar de um procedimento próprio e autónomo pelo qual, no exercício do poder disciplinar, se visa, na sequência de uma tramitação legalmente prevista, apurar a responsabilidade disciplinar do trabalhador e aplicar, quando seja o caso, uma sanção disciplinar pela prática da infração disciplinar.
2– A condenação disciplinar para se dar determinado facto como provado, não exige uma certeza absoluta, sendo admissível à Administração usar de presunções naturais, desde que as mesmas sejam adequadas.
3– Demonstrado que o agente da GNR estava na linha da frente de uma manifestação, entre manifestantes que gritavam palavras de ordem contra o Ministro da Administração Interna, que incluíam as expressões “Gatuno, Gatuno”, dos quais não se apartou antes permanecendo no local próprio daqueles que detêm uma posição de liderança, comando ou de destaque, não é credível, também perante as regras da lógica e da experiência comum, que nesse contexto, o mesmo fosse proferir outras expressões que não as palavras de ordem que estavam a ser verbalizadas pelos manifestantes e que foram captadas pelos vários canais de televisão.
4– Um militar da GNR não pode ignorar que, se como cidadão em geral, não pode proferir as expressões “Gatuno, gatuno” contra terceiros, muito menos o poderia fazer enquanto agente da autoridade a quem se impõem particulares deveres funcionais, nomeadamente, o da manutenção da ordem democrática, do estado de direito e da paz, segurança e tranquilidade públicas.
5– As expressões “Gatuno, gatuno” são injuriosas, provocam o achincalhamento público e o rebaixamento do titular do departamento governamental a quem são dirigidas.
6– A previsão constitucional e o consequente reconhecimento do direito à liberdade de expressão a qualquer pessoa (artigo 37.º da CRP) não é ilimitado perante o respeito que a todos se impõe pelo bom nome e reputação da pessoa visada (artigo 26.º da CRP), o que reclama contenção relativamente ao uso de expressões ofensivas e inaceitáveis no contexto em que são proferidas.
Sousa dos Santos

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