Tal como tem sido amplamente divulgado pelos órgãos de comunicação social, Portugal não está, nem de perto nem de longe, imune ao fenómeno do crime organizado. Reflexo disso é a detenção de 19 pessoas pertencentes a uma organização criminosa transnacional, com a apreensão de mais duas toneladas de cocaína escondidas em peles de bovinos e de 150 mil euros em dinheiro. Por outro lado, em Vilamoura, no Algarve, foi detido um cidadão sobre o qual recaem suspeitas de pertencer a um grupo internacional que branqueava capitais no sistema financeiro português.
Além disso, têm sido dada nota, com alguma frequência, da detenção de fiscais da Autoridade Aduaneira por facilitarem a entrada de cocaína nos portos portugueses. As máfias brasileiras e do Leste da Europa são apontadas como as mais ativas em Portugal. Este tipo de tráfico é atualmente considerado um dos maiores problemas de segurança do país, preocupando a Polícia Judiciária e o Serviço de Informações e Segurança. O nosso país é visto como uma rota privilegiada devido à proximidade com a América do Sul, tornando-se um ponto estratégico para abastecer o mercado europeu.
Pelo que não é de estranhar que recentemente a Europol (EU-SOCTA 2025) tenha alertado para o facto do crime organizado constituir uma das maiores ameaças à segurança da União Europeia, com impacto profundo na estabilidade política, económica e social. Isto porque as redes criminosas estão em permanente evolução, explorando diversas vertentes: tecnologias digitais, plataformas online e a instabilidade geopolítica, aproveitando o espaço digital para levar a cabo as suas operações. Além do tradicional objetivo financeiro (o lucro), não raramente as suas atividades servem interesses geopolíticos externos através de ameaças híbridas.
Desta forma, estamos perante a necessidade de uma mudança profunda na forma como os órgãos de polícia criminal atuam. Não basta a reação. É essencial e determinante a adoção de uma atitude proativa e flexível para enfrentar esta realidade.
Neste contexto devem entrar diversos vectores, a permanente análise dos dados recolhidos, a cooperação entre os diversos organismos envolvidos, a partilha de informação, o constante investimento em novas tecnologias para lutar de igual para igual no “campo de batalha online”, a necessidade imperiosa de proteger as vítimas, a aposta na estratégia, antecipando e desmantelando as estruturas que permitem que as redes criminosas prosperem. Como escreveu recentemente Vera de Sousa, “sem antecipação estratégica, sem leitura clara das tendências e sem ética sólida, as polícias não conseguirão responder aos desafios que já estão a moldar o presente”. Por seu turno, Sylvie Isabelle Figueiredo considera prioritário consolidar a capacidade de resposta do país neste domínio através do estabelecimento de uma Estratégia Nacional de Combate ao Crime Organizado.
Assim, o crime organizado não pode ser entendido como uma realidade distante, mas sim como uma ameaça concreta e em constante mutação aproveitando-se das vulnerabilidades internas e das dinâmicas transnacionais.
Exige-se, além de uma resposta firme, uma estratégia integrada que combine antecipação, cooperação internacional e inovação tecnológica. Só através de uma abordagem holística e proativa, assente na permanente partilha de informação e na ética no exercício da autoridade, será possível colocar sucessivas barreiras à expansão deste tipo de organizações, de forma a proteger eficazmente a sociedade, e garantindo, desta forma, a segurança, a estabilidade e a confiança nas instituições democráticas.
Sousa dos Santos

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