O Dia Internacional do Idoso relembra a importância desta faixa etária, mas em Portugal persistem situações alarmantes de violência, negligência, abandono e burlas contra os mais velhos, exigindo maior proteção social, comunitária e familiar para garantir dignidade, respeito e segurança.
Manuel Ferreira dos Santos
Celebra-se hoje o Dia Internacional do Idoso. Esta data tem como objetivo destacar a importância do idoso na sociedade, bem como consciencializar para as oportunidades e desafios do envelhecimento no nosso tempo.
Percorremos a imprensa e encontrámos as seguintes notícias, as quais traçam um retrato preocupante relativamente a esta faixa etária em Portugal:
- Agride pais idosos à bofetada e fica em prisão preventiva. In CM
- Cinco feridos em incêndio num prédio em Valbom. Três em estado grave. Incêndio deflagrou na habitação de um idoso. In CM
- Idoso fica preso num buraco em Vila Nova de Gaia. In CM
- Nos primeiros oito meses do ano, APAV apoiou mais de 1500 idosos vítimas de violência. In Público
- PSP encontrou em dois meses quase 400 idosos em situação de risco. In DN
- Registadas mais de 1940 burlas a idosos até 15 de setembro. In JN
Desde logo, coloca-se uma questão: onde fica a dignidade, o respeito e a segurança? Isto porque as notícias mostram que os idosos são frequentemente alvo de maus tratos e expostos a situações de risco, violência e abandono, muitas vezes pelos familiares ou pelos cuidadores que os deveriam proteger.
A este respeito, o Tribunal da Relação do Porto, num Acórdão de 18/10/2023, decidiu o seguinte:
I – O conceito de “maus tratos” não se limita às situações mais evidentes de ofensas à integridade física ou psíquica das vítimas, frequentemente traduzidas em agressões físicas/sexuais, insultos, humilhações ou ameaças, antes abarcando um espetro muito alargado de comportamentos suscetíveis de ofender a saúde física, psíquica e emocional das pessoas às quais são dirigidos, neles se incluindo ausência da prestação de cuidados alimentares e de higiene pessoal exigíveis e adequados a preservar o seu bem-estar e integridade pessoal.
II – É de notar que a APAV (Associação Portuguesa de Apoio á Vítima) identifica como exemplo de práticas de violação de direitos de pessoas institucionalizadas, entre muitas outras, «deixar pessoas idosas com dificuldade de mobilização sentadas ou deitadas durante muito tempo, sem ajudá-las a levantar-se» e «não mobilizar regularmente pessoas idosas acamadas», para além de «práticas de violação de direitos ao nível da supervisão técnica», incluindo «Não assegurar que a equipa técnica é qualificada e que há um número adequado de profissionais que a compõem», e de «Práticas de violação de direitos ao nível da higiene pessoal», nomeadamente «Deixar as pessoas idosas sujas (por exemplo, de fezes e urina) durante muito tempo» e «Não lavar as pessoas idosas acamadas na totalidade durante longos períodos de tempo». Acrescenta-se a prática de «Negligenciar a alimentação das pessoas idosas por falta de ajuda durante as refeições».
III – Compete à instituição que acolhe pessoas idosas assegurar a execução das tarefas necessárias a garantir o bem-estar e saúde dos respetivos utentes, provendo diariamente pela sua alimentação, higiene e cuidados médicos
IV – Comete o crime de maus tratos, por omissão, a instituição e respetivo representante legal (presidente do conselho executivo), que, por não dispor da quantidade de funcionários suficiente, omite a prestação dos cuidados de alimentação, higiene e mobilização dos utentes mais vulneráveis e dependentes, com a frequência e qualidade necessárias, causando-lhes lesões e consequente sofrimento físico e psíquico-emocional.
Depois, temos as burlas. Nesta matéria, as redes criminosas não olham a meios para atingir os seus fins, e os idosos são um dos seus alvos preferenciais. Para o efeito, exploram a sua solidão, a baixa literacia digital ou financeira, a confiança, a boa-fé e a fragilidade psicológica. Daqui podem resultar sérios prejuízos financeiros para quem vive com dificuldades, traumas e sentimento de vergonha.
A tudo isto temos de juntar as situações de vulnerabilidade relacionadas com determinado tipo de ocorrências (v.g. acidentes, incêndios), o isolamento, as condições de saúde precárias ou as habitações inadequadas e indignas, com consequências graves para quem vive com um leque alargado de limitações.
Para inverter esta tendência, tem que se reforçar mecanismos de proteção social, o policiamento de proximidade e os programas comunitários que garantam mais segurança. Por outro lado, deve-se fazer uma aposta clara na educação e sensibilização da sociedade (a começar nos bancos da escola), de molde a combater o idadismo e promover uma cultura de respeito. Finalmente, devem ser criadas redes de apoio familiar e comunitário, evitando que o idoso seja deixado à margem, negligenciado e vulnerável à violência.

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