I
O stalking, harcèlement ou perseguição consiste num “padrão de comportamentos de assédio persistente, que se traduz em diversas formas de comunicação, contato, vigilância e monitorização de uma pessoa-alvo”[1]. Engloba um vasto espectro de ações que vai desde as rotineiras (v.g. oferta de presentes, telefonemas, envio de sms e mails), até às intimidatórias (v.g. perseguição, mensagens ameaçadoras). A persistência dos comportamentos e o contexto em que ocorrem, consubstanciam-se numa campanha de assédio que mais cedo ou mais tarde começa a afetar o bem-estar da vítima (v.g. angústia, temor, ansiedade, perturbações de sono), podendo direcionar-se num crescendo (prolongamento temporal) suscetível de degenerar em práticas violentas (v.g. agressões verbais, físicas, tentativas de suicídio).
II
A trigésima oitava alteração ao Código Penal[2] autonomizou o crime de mutilação genital feminina, criou os crimes de perseguição e casamento forçado e alterou os crimes de violação, coação sexual e importunação sexual.
Para o efeito, no caso do crime de perseguição, foi introduzido no articulado do Código Penal o art.º 154.º-A, o qual determina que “quem, de modo reiterado, perseguir ou assediar outra pessoa, por qualquer meio, direta ou indiretamente, de forma adequada a provocar-lhe medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, é punido com pena de prisão até 3 anos ou pena de multa, se pena mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal”.
Esta disposição que visa proteger a liberdade de decisão e ação de outra pessoa, assenta no art.º 34.º da Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica (Convenção de Istambul).
III
Ao debruçar-se sobre esta temática, num aresto de o5/06/2017, o Tribunal da Relação de Guimarães considerou que “comete o ilícito do artº 154º-A, nº 1 do CP, com dolo directo o arguido que, de forma reiterada:
- Contactava telefonicamente a ofendida, a horas diversas, perturbando quer o seu desempenho profissional, quer o seu descanso;
- Deslocava-se ao seu local de trabalho, procurando encontrar-se com ela;
- Entregava quase diariamente no local de trabalho de ofendida cartas e sacas de papel com embrulhos dentro para serem entregues àquela;
- Deslocava-se, com frequência, à residência da ofendida, ora para colocar bilhetes no pára-brisas do seu automóvel, ora aguardando a sua chegada, quer à porta da entrada do prédio, quer à porta da garagem, ora, então, rondando-a, para controlar a sua rotina diária;
Agindo com o propósito de provocar à ofendida medo e prejudicar e limitar os seus movimentos, bem sabendo que desse modo a lesava na sua liberdade pessoal, como pretendeu e conseguiu”.
IV
Por fim, é de referir que Marlene Matos, investigadora da Universidade do Minho, realizou um estudo sobre esta questão, tendo concluído que 19,5 por cento das 1210 pessoas (homens e mulheres) inquiridas já foram vítimas de perseguição, e 11% referiu ser vítima no momento presente. As mulheres (67.8 %) são as principais vítimas destas várias formas de perseguição e os homens são os principais stalkers (68 %).
J.M.Ferreira
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[1] MATOS, Marlene, GRANJEIA, Helena, FERREIRA, Célia, AZEVEDO, Vanessa, Stalking – Boas práticas no apoio à vítima – Manual para profissionais, CIG, Lisboa, 2011, p. p.17.
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