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Investigação Criminal, Justiça, Segurança

Vestígios de ADN – “uma mera ferramenta”

Foi recentemente detido um suspeito da morte de duas mulheres no Algarve, o qual acabou por ser libertado e detido de seguida por um suposto envolvimento no tráfico de estupefacientes, encontrando-se neste momento em prisão preventiva. Acresce que o mesmo foi detido e condenado pelo homicídio de uma outra mulher em 2019, também no Algarve, tendo sido encontrados vestígios de ADN que apontavam nesse sentido. A este propósito, o Tribunal da Relação de Évora, num Acórdão de 14/04/2020, decidiu o seguinte:Profiling Criminal e Processo Penal

I – O ADN é apenas uma ferramenta. Dá informação, dependendo da natureza das amostras e do modo como a análise é feita.

Não é seguro que a coincidência técnica entre uma amostra problema e uma amostra referência dê como certo que o agente cuja identificação tenha sido obtida seja o autor do crime que se apura. Podem ser várias as circunstâncias e razões para o ADN de um indivíduo estar presente no local da prática do facto e isso não faz, nem pode fazer, dele culpado. Por isso, o perfil de ADN não pode ser mais do que uma ferramenta probatória ao serviço da investigação e da punição. É prova complementar e que deve ser complementada.

II – A interpretação das declarações que o Arguido prestou ao longo do processo, que não foram nunca confessórias da prática de qualquer crime, não basta para lhe imputar o que se procura punir.

Relativamente a esta questão, convém referir que no artigo 3.º, n.º 4, da Lei n.º 5/2008, de 12 de fevereiro [1], refere-se expressamente que “ qualquer pessoa tem o direito de não ficar sujeita a nenhuma decisão que produza efeitos na sua esfera jurídica ou que a afete de modo significativo, tomada exclusivamente com base num tratamento de dados”.

Desta forma, o arguido acabou por ser restituído à liberdade. Ainda efetuou um pedido de indemnização, pretensão que não teve acolhimento judicial. Ao que consta, nos casos atrás mencionados, poder-se-á estar na presença de uma atuação típica de um serial killer.

Neste âmbito, foi recentemente publicada uma obra da autoria de Celso Leal, intitulada Profiling Criminal e Processo Penal, onde se procura fazer uma análise sobre o profiling criminal, falando-se nas diversas valências pluridisciplinares que estão albergadas no profiling tendo em vista o auxílio da investigação criminal e a prevenção criminal. 

Trata-se de um importante instrumento para se “perceber a utilidade do profiling criminal e, nessa perspetiva, é necessário proceder-se a uma análise das vantagens do uso dessa técnica no âmbito do processo penal, dando especial enfoque à questão mais estudada internacionalmente – os serial killers – e aos fenómenos mais frequentes em Portugal em que esta matéria poderá ser bastante útil – criminosos sexuais e incendiários”.

Uma obra que reputamos de indispensável para uma melhor compreensão desta dinâmica.

Pedro Murta Castro

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[1] – Lei n.º 5/2008, de 12 de Fevereiro – Aprova a criação de uma base de dados de perfis de ADN para fins de identificação civil e criminal.

[2] – Outras obras deste autor:

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