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Justiça, Segurança

Situações rocambolescas

I

Ainda recentemente o tribunal escalabitano decidiu “suspender a pena de quatro anos e três meses de prisão ao assaltante que há três anos tentou atropelar o Comandante da GNR de Almeirim, por acreditarem que este ainda pode reinserir-se na sociedade e ganhar hábitos de trabalho, que nunca teve”. Em suma, esta condenação resulta de:Resultado de imagem para perseguições gnr

  • Um assalto a uma residência, quando a proprietária abriu a porta ficou logo sem os dois fios de ouro que trazia ao pescoço que lhe foram roubados pelo arguido;
  • Este pôs-se em fuga num veículo, vindo a ser intercetado mais tarde pela GNR;
  • O Comandante de Posto conseguiu meter o braço dentro do carro que o mesmo conduzia para o tentar imobilizar, tendo o arguido engrenado a marcha atrás;
  • Simultaneamente começou a fazer peões com o objetivo de atropelar o Comandante, que teve de se atirar para a vegetação na berma da estrada evitando danos maiores;
  • Apesar dos disparos de intimação pôs-se em fuga, embatendo noutro carro que seguia em sentido contrário, ainda tentou fugir a pé, mas acabou por ser detido.

Convém não perder de vista que o condenado, tem 26 anos, reside num acampamento na Zona Industrial de Almeirim, e já é detentor de um assinável percurso criminal, do qual fazem parte 11 condenações em 15 crimes de condução sem carta e três condenações por furto qualificado.

Apesar disso, os juízes concluíram que este ilustre cidadão “ainda pode organizar a sua vida e tomar consciência dos seus comportamentos”, pelo tem de “submeter-se a um programa de reinserção social a definir pela Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) durante os quatro anos e três meses para beneficiar da suspensão da pena. Se não se sujeitar ao definido pela DGRSP terá de cumprir a prisão”.

Nos termos do Código Penal, a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. Neste caso concreto, acho que prevaleceu em demasia a reintegração social em detrimento da proteção dos bens jurídicos em causa e como tal da prevenção geral e especial. Porque é exatamente nestes casos que a Justiça deve dar sinais à sociedade em geral e aos delinquentes em particular que em relação à prática de ilícitos criminais, sobretudo contra elementos das forças e serviços de segurança, não impera a impunidade. Caso contrário caminharemos para a banalização de situações como a que ficou descrita.

Imaginemos que tinha sido este ilustre cidadão a andar pendurado girando em torno de um carro da GNR com o comandante do Posto ao volante. Claro que essa notícia saltaria de um jornal regional para a imprensa nacional e durante vários dias o assunto seria dissecado pelos habituais “peritos criminais” de manhã, à tarde e à noite nas televisões, o militar seria condenado penal e disciplinarmente, acabando expulso da força de segurança, sem quaisquer contemplações em termos de reinserção social.

II

Num outro caso, envolvendo uma perseguição por parte de uma patrulha da GNR, na margem sul do Tejo, a dois cidadãos, ao que parece, de quilate idêntico ao de Almeirim, na sequência da qual acabou por morrer um dos perseguidos devido a um disparo acidental, pelo Tribunal Central Administrativo do Sul foi considerada adequada e justa a indemnização no valor de cem mil euros, sendo setenta mil euros pelo dano morte, dez mil euros pelo sofrimento da vítima até ao momento da morte e vinte mil euros pelo sofrimento do filho da vítima. Decidindo-se ainda que, “tendo em conta que numa situação de perseguição noturna a um delinquente potencialmente perigoso o militar disparou acidental e involuntariamente, a sua conduta ilícita não padece de culpa grave ou negligência grosseira, não gozando o Estado de direito de regresso contra o militar”.

Recomenda-se vivamente a leitura do acórdão para que se tenha consciência do rocambolesco da situação, e como de um momento para o outro um qualquer elemento de uma força ou serviço de segurança se pode ver envolvido numa situação que pode colocar em causa a sua vida, integridade física e outros bens juridicamente protegidos, ou de um qualquer cidadão. Ocorrendo tudo isto num quadro de decisões a tomar ao milésimo de segundo e que depois são analisadas demoradamente no conforto dos gabinetes.

III

Mas, o rocambolesco também pode ocorrer dentro das próprias instituições. Atesta na perfeição tal facto, o episódio sucedido no Posto da GNR de Aljustrel, em que “um guarda principal colocado no posto da GNR de Aljustrel apontou a arma de serviço à cabeça de um superior hierárquico”, em virtude de se considerar injustiçado por não ter tido direito a uma dispensa de dois dias (tal como a esposa também ela guarda) atribuídos pelo esforço desenvolvido pelo efetivo na quadra natalícia. Acresce que o casal de guardas para não participar desse esforço terá metido baixa médica nessa altura. A ser verdade os factos vindos a público, espera-se que desta feita, , tendo em conta a gravidade da situação, haja o “equilíbrio necessário” entre a proteção dos bens jurídicos em causa e a reintegração do agente na sociedade.

Nesta matéria, além de competir ao escalão de comando ir prevenindo este tipo de situações não deixando que atinjam o patamar descrito, também temos de reconhecer que uma das formas de as minimizar é a urgente implementação da avaliação na categoria de Guardas que neste momento é inexistente, ao contrário do que sucede com os oficiais e sargentos. Acresce que a montante tem de existir um cuidado redobrado no processo de seleção, formação e no período probatório.

L. M. Cabeço

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