I
Do elenco de atribuições da Guarda Nacional Republicana, entre outras fazem parte as seguintes:
- Prevenção da criminalidade em geral, em coordenação com as demais forças e serviços de segurança;
- Participação no controlo da entrada e saída de pessoas e bens no território nacional;
- Manutenção da vigilância e da proteção de pontos sensíveis, nomeadamente infraestruturas rodoviárias, ferroviárias, aeroportuárias e portuárias, edifícios públicos e outras instalações críticas;
- Fiscalização, ordenamento e disciplina do trânsito em todas as infraestruturas constitutivas dos eixos da Rede Nacional Fundamental e da Rede Nacional Complementar, em toda a sua extensão, fora das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto;
- No âmbito da sua missão própria, a vigilância, patrulhamento e interceção terrestre e marítima, em toda a costa e mar territorial do continente e das Regiões Autónomas;
- Controlo e fiscalização das embarcações, seus passageiros e carga, para prevenir e investigar as infrações tributárias, fiscais e aduaneiras, bem como fiscalizar e controlar a circulação de mercadorias sujeitas à ação tributária, fiscal ou aduaneira, e, supletivamente, para o cumprimento de outras obrigações legais.
II
Relativamente a um dos objetivos estratégicos da Estratégia Nacional de Combate ao Terrorismo (ENCT) denominado “Detetar” refere-se que visa:
- Identificar precocemente potenciais ameaças terroristas, mediante a aquisição do conhecimento essencial para um combate eficaz, tanto na perspetiva do seu desmantelamento isolado, quanto da deteção de outros focos de ação terrorista. A recolha, tratamento e análise de dados e informações e a sua disponibilização recíproca entre entidades responsáveis neste domínio, no território nacional e no estrangeiro, permite antecipar o conhecimento e a avaliação de ofensivas em preparação.
O que se concretiza através das seguintes linhas de ação:
- Robustecer as estruturas responsáveis pela produção e coordenação e partilha de informações relevantes na identificação da ameaça terrorista;
- Intensificar a cooperação, no plano operacional, entre todas as entidades competentes, explorando em toda a sua plenitude o potencial das tecnologias de informação e de comunicação;
- Reforçar os meios de produção, tratamento e análise de informações;
- Reforçar a eficiência na partilha da informação entre as forças e serviços de segurança ou outras entidades, no âmbito das respetivas competências, ao nível nacional, europeu e internacional;
- Reforçar os mecanismos adequados à cooperação institucional entre o Sistema de Informações da República Portuguesa e o Sistema de Segurança Interna, de modo a garantir a partilha de informação.
III
De onde resulta que em termos de atuação fora do âmbito da investigação criminal do terrorismo, ou seja no domínio da deteção e mesmo da prevenção, impõe-se que a Guarda Nacional Republicana participe na dinâmica de combate do fenómeno.
Daí que ainda recentemente numa conferência sobre este tema no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) o major-general Luís Botelho Miguel tenha afirmado que a Guarda Nacional Republicana (GNR) quer “robustecer a estrutura de recolha de informação” (uma linha de ação da ENCT) para identificar os perfis psicológicos dos jovens em risco e eventuais comportamentos de radicalização associados.
Para o efeito estará a ser criada uma Divisão de Cibersegurança na GNR com capacidade para monitorizar na net conteúdos que façam a apologia terrorista e lançar alertas de prevenção sobre potenciais ameaças, em colaboração com as autoridades competentes para a investigação, ao mesmo tempo que se contribui para a melhoria do esforço em termos de policiamento de proximidade.
IV
Fica, assim, claro que esta força de segurança não se quer imiscuir na investigação criminal de atos terroristas, mas antes, tendo em conta as suas atribuições e os objetivos estratégicos da ENCT, intervir a montante na fase de deteção e em colaboração com as autoridades competentes para a investigação[1]. O que em nada colidirá com as atribuições de outras forças e serviços de segurança, nomeadamente da Polícia Judiciária (PJ) e da sua Unidade Nacional de Contra-Terrorismo (UNCT).
Claro que se levantou logo um coro de indignação, porque o efetivo previsto para a Divisão de Cibersegurança seria melhor empregue no policiamento de proximidade, pondo em causa a segurança de populações inteiras, havendo quem se interrogue se a GNR não estaria a praticar uma espécie de terrorismo.
Mas, foi o autor dessa interrogação que há algum tempo atrás veio afirmar que a Polícia Judiciária não dispunha de recursos humanos suficientes, e que agora vem dizer que a UNCT dispõe de 25 inspetores os quais serão suficientes para as atribuições que esta Unidade tem a seu cargo nesta matéria, dispensando por isso a intervenção de qualquer outra entidade. Por outro lado afirmava que em virtude da recente criação da Unidade de Combate ao Crime Informático se antevia uma sangria de recursos humanos de outras áreas para esta nova unidade. Todos sabemos que nos tempos que correm seria impensável que este serviço de segurança (corpo superior de polícia criminal organizado hierarquicamente na dependência do Ministro da Justiça) garantisse isoladamente a prevenção e a investigação criminal de todos os fenómenos criminais.
V
A título meramente pessoal acho que o efetivo desta Divisão de Cibersegurança deve ter sido pensado tendo em linha de conta todos os constrangimentos existentes nesta força de segurança. Além disso, basta olhar para os números para se constatar que o policiamento de proximidade está funcionar e que não existe qualquer espécie de terrorismo contra a população a que a GNR garante segurança, pois se assim não fosse não se teria afirmado publicamente no 104.º aniversário desta força de segurança que estaremos perante “os níveis de criminalidade mais baixos de sempre”.
VI
A tendência nas forças e serviços de segurança, tal como noutras organizações (v.g. Forças Armadas), é para o investimento em novas tecnologias (v.g. cibersegurança) que apoiam o policiamento e permitem uma redução do efetivo empenhado.
Daí que ao nível comunitário no Programa «Horizonte 2020 — Programa-Quadro de Investigação e Inovação (2014 -2020)» exista um programa específico «DS7- Sociedades Seguras — Proteção, Liberdade e Segurança da Europa e Seus Cidadãos», para o qual foi nomeado como Legal Entity Appointed Representative (LEAR) do Ministério da Administração Interna (MAI), o seu Secretário-Geral.
Este programa específico está direcionado para as seguintes vertentes:
- Atuação em catástrofes;
- Resposta ao terrorismo;
- Segurança fronteiriça;
- Cibersegurança.
VII
Em suma:
- Se conjugarmos as atribuições da GNR e os objetivos estratégicos da ENCT, nada obsta à implementação de uma estrutura de cibersegurança com fins meramente de deteção e prevencionais nesta força de segurança;
- O caminho a seguir nestas matérias passa pela cooperação entre as diversas forças e serviços de segurança;
- A utilização das novas tecnologias permite que o policiamento de proximidade disponha de um conjunto de ferramentas que otimiza o mesmo com menos recursos humanos;
- Nesta senda, o MAI, ministério a que a GNR pertence, participa no programa específico «DS7- Sociedades Seguras — Proteção, Liberdade e Segurança da Europa e Seus Cidadãos»;
Embora compreenda a motivação que está subjacente ao tipo de opinião descrita no ponto IV, não a aceito devido ao alarme social que pode provocar e porque quem a emite se esquece que está incluído num sistema onde todos os atores devem contribuir para um mesmo fim: a segurança dos cidadãos.
Manuel Ferreira dos Santos
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[1] Aliás à semelhança daquilo que faz o Centro Nacional de Cibersegurança, o qual atua em articulação e estreita cooperação com as estruturas nacionais responsáveis pela ciberespionagem, ciberdefesa, cibercrime e ciberterrorismo, devendo comunicar à Polícia Judiciária, no mais curto prazo, os factos de que tenha conhecimento relativos à preparação e execução de crimes.
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