I
O acesso a metadados por parte dos serviços de informações tem sido alvo de acesa controvérsia. Esta questão ganhou um novo impulso a partir da publicação da Estratégia Nacional de Combate ao Terrorismo, onde é dado particular enfâse ao reforço dos meios de produção, tratamento e análise de informações, e dos mecanismos adequados à cooperação institucional entre o Sistema de Informações da República Portuguesa e o Sistema de Segurança Interna, de modo a garantir a partilha de informação.
Em 2015 iniciou-se um processo de revisão da legislação que visava a permissão de acesso a tais dados por estes serviços, tendo o Presidente requerirdo ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva da constitucionalidade de uma norma do diploma. O Tribunal Constitucional através do Acórdão n.º 403/2015, de 27/08/2015, pronunciou-se pela inconstitucionalidade da norma constante do n.º 2 do artigo 78.º do Decreto n.º 426/XII da Assembleia da República, que aprovava o Regime Jurídico do Sistema de Informações da República Portuguesa, com base em desconformidade com a proibição de ingerência nas comunicações, consagrada no artigo 34.º, n.º 4 da Constituição.
II
Posteriormente o processo foi reiniciado, tendo sido aprovado o Decreto da Assembleia 147/XIII, o qual regula o procedimento especial de acesso a dados previamente armazenados pelos prestadores de serviços de comunicações eletrónicas que se mostrem estritamente necessários para a prossecução da atividade de produção de informações pelo Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) relacionadas com a segurança interna, a defesa, a segurança do Estado e a prevenção da espionagem e do terrorismo, o qual é sujeito a acompanhamento do Ministério Público e controlo judicial. Desta forma, contorna-se a argumentação constante Acórdão n.º 403/2015, de 27/08/2015 do Tribunal Constitucional, segundo a qual no modelo proposto nessa altura não existiria um controlo equivalente ao do processo criminal, pondo-se em causa o artigo 34.º, n.º 4 da Constituição.
Para permitir este acompanhamento pelo Ministério Público e o controlo judicial procedeu-se à segunda alteração à Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário).
III
Por sua vez, o Presidente da República, atendendo ao consenso jurídico atingido, tendo em vista ultrapassar as dúvidas que haviam fundamentado anteriores pedidos de fiscalização preventiva da constitucionalidade, e tendo presente a relevância do regime em causa para a defesa do Estado de Direito Democrático, e em particular para a proteção dos direitos fundamentais, promulgou o diploma em causa(Decreto n.º 147/XIII).
Os serviços de informações são uma das peças fundamentais na prevenção e combate do fenómeno terrorista. Há algum tempo atrás, Júlio Pereira apontava para a perda de operacionalidade decorrente de uma tendência constante de perda de quadros qualificados, que resulta não apenas do envelhecimento da pirâmide etária, mas, crescentemente, da falta de atratividade e de capacidade de retenção de talento. Referiu ainda a falta de meios legais (v.g. acesso a metadados, escutas), de evolução e investimento em termos de recursos logísticos e tecnológicos. No que se refere aos meios legais, com a promulgação deste diploma assistimos à remoção de um obstáculo que permitirá um melhor desempenho destes serviços.
Por fim, não poderíamos deixar de dar nota da recente publicação do Relatório da Europol sobre a situação e tendência do terrorismo na União Europeia em 2016.
Manuel Ferreira dos Santos
Discussão
Ainda sem comentários.