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Ambiente, Catástrofes, Proteção Civil, Segurança

De Chernobyl a Almaraz

A produção de energia nuclear apresenta como aspetos positivos, o processo de conversão mais eficiente, a diminuição da emissão de gases para a atmosfera, o aumento do número de empregos na zona de instalação das centrais; e como aspetos negativos principais, o elevado risco de acidentes com consequências muito nocivas para o planeta, elevados custos financeiros no que respeita à sua construção e manutenção, a longevidade do lixo atómico (240 mil anos) e as preocupações em torno do seu armazenamento, a libertação de radiações em caso de acidente.

Em matéria de acidentes desta natureza, não se pode deixar de mencionar o caso de Chernobyl, ocorrido a 26 de Abril de 1986, com a explosão de uma central nuclear, mercê da qual foram enviadas 190 toneladas de urânio radioativo e grafite para a atmosfera, obrigando à retirada de 120 mil pessoas de uma região correspondente a uma zona de 30 quilómetros ao redor da central. O reator nuclear ardeu durante dez dias, e os materiais radioativos viajaram com a chuva e com o vento para zonas longínquas da Rússia, Bielorrússia e Ucrânia. Como resultado direto do acidente morreram 32 pessoas a combater o incêndio que se seguiu e outras 38 morreram, nos meses seguintes, na sequência das radiações de que foram alvo. De seguida a radioatividade espalhou-se por todo o Norte da Europa, onde muitos animais e plantas passaram a registar maior radioatividade. A população que reside nas áreas limítrofes vive ameaçada, por doenças ou pela discriminação, tendo aumentado o número de casos de cancro da tiróide (especialmente nas crianças), problemas do coração ou deformações congénitas.

Sobre esta questão Svetlana Aleksievitch publicou a obra “Vozes de Chernobyl – História de um desastre nuclear”, onde “dá voz a centenas de pessoas que viveram a tragédia: desde cidadãos comuns, bombeiros e médicos, que sentiram na pele as violentas consequências do desastre, até as forças do regime soviético que tentaram esconder o ocorrido. Os testemunhos, resultantes de mais de 500 entrevistas realizadas pela autora, são apresentados através de monólogos tecidos entre si com notável sensibilidade, apesar da disparidade e dos fortes contrastes que separam estas vozes”.

Neste momento França é a campeã nuclear da Europa, tendo cerca de 80% da eletricidade gerada por energia nuclear. Estima-se que a nível mundial, a breve trecho sejam construídas cerca de 200 novas centrais.

Portugal não dispõe de nenhuma central nuclear, embora Espanha disponha de várias, estando uma delas, a de Almaraz, a cerca de 100 Km da fronteira portuguesa, podendo o território português ser afetado em caso de acidente. Além de outros registados anteriormente, esta central desde o início de fevereiro tem vindo a apresentar alguns problemas, tendo o Conselho de Segurança Nuclear de Espanha alertado para “falhas no sistema de arrefecimento de serviços essenciais da central nuclear” e referido que não havia “garantias suficientes de que as bombas de água do sistema de serviços essenciais operem com normalidade”. Por sua vez a Agência Portuguesa do Ambiente apressou-se a dar nota à imprensa da receção de garantias de que existem condições de segurança.

No passado fim-de-semana ocorreu mais uma avaria, trata-se de uma central dos anos 80, das mais antigas da Europa, com registo de vários incidentes que tem estado na base de diversas paragens de funcionamento, recorde-se que o tempo de vida útil de uma infraestrutura desta natureza varia entre os 20 e os 40 anos. A Quercus já a classificou como uma “bomba-relógio”, e segundo a Greenpeace terá chumbado num teste de resistência pedido pela Greenpeace, evidenciando a falta do mesmo tipo de válvulas que permitiu o acidente em Fukushima, Japão.

Esperemos que impere o bom senso e que Chernobyl ou Fukushima não se repita em Almaraz, mais uma vez recordo a 100 km da fronteira portuguesa e num rio internacional ibérico que tão mal tratado tem sido.

Sousa dos Santos

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